segunda-feira, 9 de junho de 2008

Respeito ao Velho Chico

Mauro Chaves

Ao se omitir de um debate profundo sobre o projeto de transposição do Rio São Francisco, deixando que a sociedade brasileira e as futuras gerações venham a sofrer os efeitos desastrosos de um "fato consumado", imposto pelo governo, o que pode resultar numa obra tão faraônica quanto ambientalmente estúpida, o Congresso Nacional está passando um recibo de criminosa irresponsabilidade.

O Velho Chico, rio da integração nacional, cuja força das águas já foi tamanha que durante séculos o fez avançar vários quilômetros adentro do Oceano Atlântico, a ponto de embarcações pararem em pleno oceano para se abastecerem de sua água doce, hoje sofre em sua foz um trágico recuo, por insuficiência de vazão. Já se disse que esse projeto de transposição é a transfusão que tem como doador um doente internado na UTI. Se a idéia de levar águas do São Francisco, por gravidade, para o semi-árido do Nordeste setentrional já estava na cabeça generosa de dom João VI, é porque naquele tempo não existiam açudes, nem adutoras, nem estudos hidrogeológicos.

Durante séculos muitos têm defendido a transposição como solução salvadora para a tragédia das secas. Mas a quantidade formidável de açudes já construídos - que já chega a cerca de 70 mil - e a possibilidade de retirada de água do subsolo nordestino (que, embora muitos não saibam, é abundante em água) sugerem soluções muito menos dispendiosas e mais eficazes para distribuir água às populações que dela mais necessitam. E distribuição, no caso, é a palavra-chave, pois em grande parte a malsinada "indústria das secas" nordestina tem sido mantida pelos chefetes políticos para comandar o abastecimento de água de seus currais eleitorais. A transposição não significará a oferta de água a 12 milhões de nordestinos - como têm dito seus defensores -, mas sim a canalização para determinados projetos de irrigação do agronegócio, enquanto falta distribuição de água até para projetos e populações bem mais próximas do rio, nos Estados ribeirinhos.

O engenheiro Manoel Bomfim Ribeiro, especialista em hidrologia e geologia, ex-diretor do Dnocs e autor do livro Potencialidades do Semi-Árido Brasileiro, num texto sobre as obras inconclusas do Nordeste assevera: "A indústria das secas é um fato inerente à vida política da região nordestina tendo como carro chefe o pipa a desfilar pelos nossos sertões sequiosos, onde o chefe político exerce o seu poder sobre a água. Esta indústria vem num crescendo constante com obras de todos os tamanhos, açudes, canais, adutoras, obras inconclusas. Agora é a vez da Transposição, obra inócua e desprovida de significado, pois que o Nordeste setentrional, penhoradamente, agradece e dispensa as águas do rio São Francisco, por total e absoluta falta de necessidade, uma vez que já acumula, somente nos oito grandes açudes, 13 bilhões de metros cúbicos de água (5 vezes e meia a baía da Guanabara), exatamente os 8 açudes plurianuais que irão receber os magros 2 bilhões/m3 anuais (127m3/s) advindos do canal da Transposição. A evaporação anual dos 13 bilhões é da ordem de 4 bilhões, o dobro da água que vai chegar do rio. Uma irrisão. Mais ainda, os 3 Estados mais ávidos por mais água, Paraíba, Rio Grande do Norte e Ceará, já acumulam nos seus imensos reservatórios 26 bilhões de metros cúbicos, 70% das águas estocadas no semi-árido brasileiro, 11 vezes as águas da baía da Guanabara."

E em outro texto escreve o especialista: "Dos aqüíferos do Nordeste podem ser extraídos até 20% das reservas existentes, cerca de 27 bilhões de m3/ano sem queda de pressão hidrostática, pois são reabastecidos, anualmente, pelas águas de chuvas e que drenam verticalmente para o seio da terra. Só extraímos até hoje cerca de 4% deste potencial disponível, 800 a 900 milhões de m3 através de 90.000 poços, sendo que 40% destes estão paralisados por razões diversas menos por falta de água. O deserto de Negev, com área de 16.000 km2, fornece para Israel 1 bilhão de m3/ano de água extraído do seu subsolo, mais que a produção da nossa região cuja área é 60 vezes maior que aquele deserto."

Para o jurista Ives Gandra Martins, há pelo menos cinco argumentos sobre a inconstitucionalidade da transposição: fere o pacto federativo - atinge quatro Estados que não foram consultados (Minas, Bahia, Sergipe, Alagoas); fere o princípio da razoabilidade - já que há formas menos onerosas, sem prejudicar o Rio São Francisco, utilizando-se de reservas de água do subsolo ou da interligação de açudes nos Estados donatários; fere o princípio da proporcionalidade - ao, em vez de revitalizar o rio, enfraquecê-lo ainda mais com a transposição de suas águas; fere o princípio da preservação ambiental - por destruir fauna e flora das margens do Rio São Francisco, além da flora fluvial e das espécies de peixes; fere o princípio da eficiência, pois se gastará mais dinheiro dos contribuintes para um projeto muito mais oneroso do que o da ligação dos açudes ou da retirada de água do subsolo.

Esse projeto faraônico, de pelo menos R$ 15 bilhões, além de poder resultar em desastre ambiental - como o do Rio Colorado (para o México) e o do Rio Amarelo, na China, dentro do "espetáculo de horror dos rios que morreram" a que se refere João Alves Filho -, está criando uma cizânia entre os Estados ribeirinhos e o do Nordeste setentrional, acirrada pelo presidente Lula, quando disse aos cearenses que seus irmãos nordestinos não lhes negarão (com a transposição) "uma cuia de água". Só não contou que está mandando o Velho Chico pra cucuia.

Se o Congresso mostra vergonhosa frouxidão em não debater esse tema, cabe à sociedade mobilizar-se para fazê-lo.

Mauro Chaves é jornalista, advogado, escritor, administrador de empresas e pintor. E-mail:mauro.chaves@attglobal.net



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segunda-feira, 2 de junho de 2008

Mudança climática vai afetar geração de energia no Nordeste

 

02/06/2008 - 09h37

 

JANAINA LAGE
da Folha de S.Paulo, no Rio

 

As mudanças climáticas previstas para as próximas décadas prejudicarão mais a produção de energia na região Nordeste. Esta é uma das principais conclusões de um estudo da Coppe/UFRJ, que procura medir o impacto dos efeitos climáticos sobre a produção de energia a partir de fontes renováveis no período de 2071 a 2100. O Nordeste sofrerá efeitos na geração de energia hidrelétrica, eólica e na produção de biodiesel.

A pesquisa foi patrocinada pelo Reino Unido por meio do Global Opportunity Fund e faz parte do projeto de uso dos cenários de mudanças climáticas para estudos de vulnerabilidade e adaptação no Brasil e na América do Sul.

Os pesquisadores ressaltam que, em razão do grande número de incertezas e da necessidade de bases de dados mais completas, o estudo é mais um indicador de tendências.

"As regiões áridas se tornarão mais áridas e o problema da irrigação aumentará. Haverá menor incidência de ventos. O sistema energético do interior do Nordeste é menos robusto do que o do Sudeste e é menos capaz de responder a variações climáticas", afirma Alexandre Szklo, um dos autores.

As hidrelétricas da bacia do São Francisco serão as mais atingidas, com perspectiva de queda na produção de energia de até 7,7% na estimativa mais pessimista. Foram definidos dois cenários, um de emissões altas e outro de baixas emissões de gases do efeito estufa.

O primeiro prevê aumento de temperaturas e o segundo supõe chuvas e ventos mais reduzidos. O estudo usa ainda as projeções do Plano Nacional de Energia 2030, da EPE (Empresa de Pesquisa Energética).

Para José Goldemberg, físico da USP e especialista em energia, as conclusões não deixam dúvidas: "Isso mostra que o país não pode assumir a postura de que o problema não é conosco. A questão do Nordeste está ligada à circulação de água na Amazônia. O que devemos fazer é engajar o Brasil nas negociações internacionais que têm como finalidade reduzir as emissões de gases do efeito estufa", afirmou.

Para o presidente da EPE, Maurício Tolmasquim, é preciso observar os resultados com cautela porque as projeções envolvem muitas incertezas. Apesar disso, avalia os resultados como favoráveis, com perspectiva de expansão do álcool e queda pequena das hidrelétricas. Sobre a oferta de energia no Nordeste, ele avalia que o fator regional tende a perder importância no futuro.

"É razoável supor que daqui a 50 anos não vai haver limite de intercâmbio de uma região para outra. Você vai ter transmissões com redes contínuas e outras tecnologias que estão nascendo, e a regionalização perde sentido", disse.

Demanda em alta

O estudo avaliou ainda o aumento da demanda de energia em razão das mudanças climáticas e verificou que haverá, no cenário mais pessimista, uma elevação de 8% no consumo total de eletricidade no país. Foram levados em conta, nessa projeção, os aumentos da temperatura média e também do número de dias quentes.

O cálculo considera que o aparelho de ar-condicionado é ligado com temperaturas acima de 24C . O consumo de eletricidade no setor residencial deve aumentar até 9% e o do setor de serviços, até 19%.

Em 2005, o uso de aparelhos de ar-condicionado nas residências representou 7,6 TWh (terawatts/hora), o equivalente a 9,2% do consumo total de eletricidade no setor residencial.

Para 2030, a projeção é de um consumo de 14,8 TWh, o que significaria uma participação de 5,2%.

 


André Picardi
Pousada Canastra (Toca do Picardi)
 


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Estudo mostra que energia no Brasil é vulnerável a aquecimento

Seg, 02 Jun, 07h09
Por Denise Luna - Reuters

RIO DE JANEIRO (Reuters) - Patinho feio dos leilões de energia até agora, o bagaço de cana poderá ganhar status de estrela na geração de energia no final deste século, já que a cana-de-açúcar será a única fonte energética no Brasil que não sofrerá impactos com o aquecimento global.
Por outro lado, a energia eólica deve ficar restrita ao litoral e as hidrelétricas vão produzir menos do que hoje por redução das chuvas, assim como a soja deverá migrar para o Sul em busca de clima mais favorável.
Estas e outras conclusões estão no estudo encomendado pelo Reino Unido através do Global Opportunity Fund a professores e pesquisadores da Coppe, instituto de pós-graduação e pesquisa da Universidade Federal do Rio de Janeiro, liderados por Roberto Schaeffer e Alexandre Salem Szklo, para avaliar o impacto das mudanças climáticas no sistema energético brasileiro no período 2071 a 2100.
"Trata-se basicamente de entender como o sistema energético brasileiro planejado para 2030 reagiria às novas condições climáticas projetadas para o período que vai de 2071 a 2100", explica em sua introdução o trabalho que levou oito meses para ficar pronto.
A vulnerabilidade encontrada, segundo Roberto Schaeffer, acende uma luz amarela em alguns programas do governo e investimentos privados, que deveriam ser repensados.
"O que o estudo chama a atenção é de que não adianta pensar mais em desenvolvimento do Brasil ou apostar fundo em certas regiões se você não começar a olhar a vulnerabilidade delas às mudanças climáticas, pode ser maior ou menor, mas provavelmente o futuro será pior do que hoje", explicou Roberto Schaeffer à Reuters.
Ele citou projetos hidrelétricos na Amazônia, que estão sendo apontados como a solução para o país --rio Madeira, Belo Monte-- como exemplo de uma possível frustração futura diante das mudanças climáticas.
"Há tendência da Amazônia savanizar, ou seja, ficar mais seca, e o Nordeste que já é semi-árido vai ficar mais árido", afirmou.
Nem os ventos escapam das mudanças no clima, segundo o estudo, apontando para uma tendência de migração da produção eólica do interior para o litoral, limitando o crescimento dessa indústria.
"O Brasil tem potencial eólico muito grande, mas muito disperso. A gente mostra (no estudo) que esse potencial grande acaba e fica muito concentrado na costa, vamos ter ventos 30 a 60 por cento menores do que temos hoje", informou.
Outro problema será enfrentado pelas culturas de soja e outras oleaginosas usadas para a produção de biodiesel, que terão que buscar o Sul do país se quiserem continuar existindo.
"Um programa de biodiesel, por exemplo, que era pensado em questões familiares, pequenas propriedades, é uma questão que não dá para assinar em baixo ainda, mas a vulnerabilidade é muito grande e os estudos estão apontando que dendê, soja, mamona etc não vão nascer no Nordeste", afirmou.
Já a cana ganharia mais áreas para ser plantada, por gostar de calor, e o bagaço, hoje praticamente desprezado para gerar energia, poderia compensar as perdas hidrelétricas.
"O bagaço pode assumir um papel importante que ele não tem hoje", afirmou.
VELHO CHICO
Com menos chuvas devido ao aquecimento do planeta, a transposição do rio São Francisco também pode ser considerado um projeto arriscado pela tendência de queda hidrológica.
"Em todas as bacias hidroelétricas brasileiras sempre a geração de eletricidade vai ficar pior e com o passar do tempo não vai melhorar", disse Schaeffer.
"O Nordeste que hoje já é pobre em chuva vai ficar mais pobre, e a Amazônia que hoje é rica em chuva vai ficar mais seca, o que vai ser favorável para algumas culturas de um lado, mas vai reduzir a produção das hidrelétricas", complementou.
Em cálculos conservadores, que serão revistos ao longo dos próximos 12 meses em uma versão mais sofisticada do estudo pelo próprio grupo, a bacia do São Francisco é a que apresenta maior queda de vazão média anual, ou seja, a que terá menos água para mandar para suas usinas.
A vazão da bacia do São Francisco registraria queda de 23,4 por cento no cenário mais otimista e de 26,4 por cento no mais pessimista, enquanto na bacia do rio Paraná as previsões de queda ficam em 2,4 e 8,2 por cento, respectivamente.
Se confirmadas as quedas, o total da energia média gerada pelas hidrelétricas brasileiras cairia 1 por cento no cenário otimista e 2,2 por cento no mais pessimista.
"A gente sabe que o número é muito conservador...mas o modelo trabalha com médias, e por isso é melhor não se fixar em número, mas a tendência é de que vai piorar, o que faz com que estudos mais sofisticados sejam feitos para saber o quanto vai piorar", disse o acadêmico.
Ele explicou que na próxima fase do estudo já deverá contar com uma avaliação de quanto custa para tentar minimizar o impacto climático na economia e quanto custa não fazer nada.
"Esse estudo mostra que nada é um assunto fechado, que tudo tem que ser melhor estudado, e como o Brasil depende muito de fontes renováveis de energia a vulnerabilidade é maior e por isso mais uma razão para o Brasil começar a se precocupar com isso", finalizou.

domingo, 1 de junho de 2008

Eu sou favorável à transposição do Rio São Francisco

A um ano atrás quando me perguntavam sobre a transposição do Rio São Francisco minha resposta era contrária à proposta, hoje isto mudou.
Diante das publicações dos relatórios do IPCC sobre as mudanças climáticas, percebi que o grave problema da seca no semi-árido brasileiro tende a se agravar em tempo muito curto. Cientistas do Brasil e de todo o mundo afirmam que o semi árido tende a um rápido processo de desertificação, é necessário que se adotem medidas urgentes para o fornecimento de água até esta região.
Outro fator muito importante que me induziu a esta mudança de posição foi o acesso a informações sobre as outorgas já existentes para consumo de água do Rio, o volume a ser retirado do São Francisco para a transposição é igual a um terço da água consumida por um único, dos muitos projetos de agricultura irrigada na bacia, o Jaíba.
Além disso, a decisão de realizar as obras de transposição foram o maior dos estímulos para que pela primeira vez se elaborasse e colocasse em prática, no Brasil, um programa para a revitalização de uma bacia hidrográfica.
A nós, ambientalistas e sociedade civíl, cabe acompanhar as ações do programa de revitalização muito de perto, sugerindo melhorias e corrigindo eventuais falhas e imperfeições, o sucesso deste programa pode ser o estímulo e o exemplo a serem seguidos e aplicados em outras centenas de rios brasileiros ameaçados de secarem, pela erosão, pelo assoreamento, pela poluição de suas águas, pelo mau uso e pela falta de responsabilidade, seja dos empreendedores ou do poder público.

Sejam todos muito bem vindos a este espaço "livre", aguardamos a sua manifestação!

André Picardi